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Juventude exilada

  • Foto do escritor: Rosa Miranda
    Rosa Miranda
  • 19 de jun. de 2018
  • 3 min de leitura


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Sem esperança em mudanças no país, cada vez mais brasileiros sonham com a vida no exterior (Foto: Arquivo/Folha)

Triste de um país que não alimenta mais esperanças na alma das suas futuras gerações. Assim é o Brasil, fato dolorosamente comprovado pela pesquisa do Instituto Datafolha divulgada neste domingo (17). Ao menos 62% dos jovens brasileiros entre 16 e 24 anos de idade ouvidos no levantamento admitiram ter vontade de abandonar o país. Em números reais isso representaria uma migração para o exterior de nada menos que cerca de 70 milhões de pessoas. Numa comparação feita pelo Datafolha, seria como se desaparecesse, de uma hora para a outra, um contingente de pessoas equivalente às populações dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, juntos. É grave, principalmente para um país que já sofre com o processo de envelhecimento.

Essa busca por melhores condições no exterior inclui qualidade de vida, emprego, segurança, educação, saúde e estabilidade. No mês passado, o Datafolha já havia constatado o desejo de 43% dos adultos de abandonarem o Brasil. Na nova rodada, 56% dos profissionais com curso superior fazem, ou já fizeram, planos de se mudar. A maioria tem na mira países como Estados Unidos, Canadá e Portugal. Mas para muitos, qualquer lugar que ofereça um mínimo de estabilidade, serve. Ingratidão? Nada disso. Boa parte das pessoas que confessam a vontade de deixar o país fazem parte da fatia que já brigou ou ainda briga por mudanças na política, na economia, na ética e na oferta de serviços públicos. Mas a desesperança anda batendo cada vez mais forte à porta.

No caso dos acadêmicos que planejam se lançar fora das fronteiras, há a expectativa de um retorno em alguns anos. Assim, com essa exportação temporária, o país até estaria investindo em qualificação de mão de obra. A teoria, porém, não chega a ser um alento. Dentro das universidades, as possibilidades de intercâmbio são bem maiores que para profissionais liberais e jovens técnicos ou estudantes que topam arriscar-se no exterior. Entre esses, as chances de retorno são proporcionais ao tamanho da desilusão com o país.

Aos ufanistas – se é que ainda existem – e defensores de uma resiliência bem atada às raízes, é bom não tomar como base de avaliação a própria situação, nem confundir desistência com covardia. Há quem classifique como “complexo de vira-latas” o sonho de migração dos que dizem enxergar noutro país vantagens que não existem por aqui. Longe disso. Trata-se, na verdade, de uma necessidade imperiosa de progredir na vida, cada vez mais difícil nas atuais condições do Brasil.

Geralmente, esses críticos são exatamente os que têm a própria situação relativamente resolvida. Por sorte ou competência, que seja, conseguiram vencer os obstáculos cada vez mais intransponíveis criados cotidianamente ao avanço pessoal e profissional no país. Seja por falta de oportunidades no setor privado, seja pela eterna incompetência do poder público em prover melhores condições. Enfim, cada um tem olhado mais e mais para o próprio umbigo, o que torna a crítica ao próximo bem menos consistente.

Não é que a coragem de tentar mudar a situação tenha abandonado de vez os brasileiros. Este ano, mais uma chance será dada a todos os eleitores de chutar para longe um punhado de problemas, e seus causadores. Entretanto, para muita gente – como revela a pesquisa Datafolha – paciência e resiliência definitivamente sucumbiram diante de tantas tentativas frustradas de contribuir para nas urnas para alguma mudança concreta, não só na situação do país, mas na mentalidade tacanha de boa parte dos seus conterrâneos que, de forma individualista, preferem criticar os outros e continuar vivendo sob as confortáveis regras da brasileiríssima Lei de Gérson.


Matéria original no site sergiomontenegro, disponível aqui

 
 
 

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